O clima de “já ganhou” é um perigo. Ao sentar na cadeira de prefeito antes da hora e perder as eleições para Jânio Quadros, em 1985, Fernando Henrique Cardoso ilustrou isso de modo irretocável. Quase 35 anos depois, esse clima se insinua a cada divulgação de pesquisa de intenção de voto.

O resultado das eleições 2022, porém, ainda não é tão previsível quanto parece por dois aspectos principais. O primeiro, diz respeito à incerteza inerente à tomada de decisão. Pesquisa CNT/MDA (9 a 11 de dezembro) mostra que 41% do eleitorado ainda não definiu seu voto para presidente em 2022. Desses, 25% dizem que só vão fazer isso após o início do horário eleitoral e dos debates, e 15% somente na última semana antes das eleições.

Esses números tendem a cair gradualmente na medida em que se aproxima o dia da votação. Até lá, mesmo quem afirma já ter decidido em quem votar não estará imune a alguma volatilidade. Sérgio Moro é apontado como segunda opção para 22% dos eleitores de Bolsonaro; e Ciro, para 25% dos de Lula. Mas o que chama atenção é um dado que reforça o favoritismo do ex-presidente, citado por 41% dos eleitores de Ciro como segunda opção. Com isso, é possível ter uma ideia sobre o destino de parte dos votos em eventuais mudanças de opinião.

O outro aspecto trata das limitações de previsão de resultado eleitoral a partir de pesquisas de intenção de voto. A discrepância entre percentuais de diferentes institutos e o resultado nas últimas eleições colocou em xeque esse tipo de levantamento. Fraudar percentuais é algo possível, claro, mas pouco provável por motivo óbvio: implicaria em um elevado custo para a reputação e para os negócios dessas empresas, principalmente para os institutos com estrada no mercado.

Mais provável é, portanto, a hipótese do aumento da volatilidade na preferência do eleitorado. Exposto a fluxos comunicacionais frenéticos em redes e mídias sociais digitais, ele está mais suscetível a mudar de opinião em um curto espaço de tempo, o que demanda dos institutos ferramentas mais precisas para aferir preferências e antever possíveis mudanças.

Seja pelo volume de eleitores ainda indecisos ou desatentos, seja pela dificuldade de captar preferencias estáveis, é preciso cautela diante dos números de intenção de voto. Entre vencedores ou perdedores, há muita incerteza. E sentar na cadeira de incumbente antes da hora, a história ensinou, pode dar azar.

Juliano Domingues, cientista político, é professor Unicap.
Texto publicado no Jornal do Commercio no dia 19 de dezembro de 2021.